Preta, você não é o seu trabalho
Esse texto é para todas as pessoas negras que em algum momento se sentiram ou se sentem sozinhas em ambientes corporativos, que tem medos, anseios e a famosa “síndrome do impostor”
Faz anos que eu queria escrever esse texto pois fiquei muito tempo tentando digerir, me entender, abraçar os meus sentimentos e tirar a culpa.
Antes de contar minha experiência, como boa UX Researcher que sou, quero trazer alguns dados para vocês. Trabalhamos com dados, né mores?
Uma pesquisa realizada pela comunidade Indique Uma Preta, trouxe um panorama sobre a realidade de nós, mulheres negras no mercado de trabalho e os impactos do racismo na evolução profissional.
Fonte: Potencias (in)visíveis por box 1824 e IndiqueUmaPreta, 2020.
Mercado de trabalho
Por muito tempo eu me senti culpada por diversas inseguranças, mas na real, eu sempre tive um potencial que não era explorado ou motivado a florescer.
Fui a pessoa revolucionária que pensava em oportunidades, construía, apontava e trazia soluções para os negócios, mas no mundo corporativo algumas características não são aceitas com bons olhos. A diferença é perceptível: quando uma mulher preta fala, ela nunca é vista ou ouvida.
O O racismo na minha vida sempre foi velado. Passei anos para ter minha consciência racial e me apropriar da minha história. Demorou 24 anos para olhar no espelho e entender "sou preta mesmo, e sou maravilhosa"
Por não acreditar no tamanho da minha força, sempre achava que não estava pronta para nada: era mil cursos, livros e mentorias para tentar estar a par de tudo, mas no fundo não era isso que eu precisava.
Em algumas organizações nosso criativo é bloqueado pela comparação com os nossos pares, principalmente aquelas que que tiveram apoio a subir alguns degraus na carreira: os que já viajaram para 25 países, os que tinham certificados renomados e outros com formações em faculdade renomadas. O que eu precisava era de apoio.
Um grande aprendizado que tive com muitos acontecimentos e muita terapia, é que se você, pessoa preta estiver se comparando com uma pessoa branca, sempre gerará uma enorme dor e insegurança.
Essas pessoas já nasceram com a auto estima profissional e sempre foram vistas ou aceitas pelo mercado muitos anos antes da nós, e ainda são.
Nós, sempre carregamos o peso de fazer o dobro e muitas vezes em vão para algumas empresas.
Comecei a refletir sobre a importância de entender os meus sentimentos, de expor e de falar sobre a minha vulnerabilidade. Nos disseram que precisamos ser fortes o tempo todo. A verdade: é que não precisa ser, por que somos humanos.
A mulher preta, passa a vida toda achando que ganhou na loteria quando recebemos apenas o mínimo. E não percebemos o tamanho desse problema, por que quando temos grandes oportunidades duvidamos até da nossa conquista e verdade.
O medo
Temos medo de pedir salários, não nos sentimos confortáveis em estar em lugares por não encontrarmos muitos de nós, mesmo com todos os movimentos de diversidade acontecendo ainda sinto que muitos líderes precisam aprender sobre o tema, sobre como desenvolver pessoas pretas e antes de pensar em pedir que ela produza ou saiba de mil coisas, buscar entender o background dessa pessoa.
Temos nossa estima baixa por que o mundo diz o tempo todo que não somos capazes e acabamos esgotadas (com burnout). Eu já passei por isso, por não suportar, por ter medo e por achar que aquele trabalho era a única coisa da minha vida e que eles estavam sendo fofos se preocupando com o meu bem estar e lazer. Mas na real, era pra eu poder ficar e produzir mais, sem direto a ficar esgotada.
Ter essas políticas da organização e não ter alinhamento com a liderança, só vai ser uma empresa moderna com a fachada "sou diversa " mas com quase metade dos funcionários pretos com problemas sérios de estima profissional como aconteceu comigo.
Auto estima
Passei muito tempo questionando se eu era uma farsa e porque aquilo estava acontecendo, porque eu não era ouvida, sobre a oportunidades que não existiam, e esquecendo de minha jornada e potência e como evolui até chegar aqui. Escrevo aqui para vocês.
O que estou trazendo aqui é que sempre tive medo de perder meu emprego, a estima que levei anos pra construir e que deixei ser afetada por pessoas que não conhecem e nunca se colocaram no meu lugar, sabemos que vivemos dentro de um sistema capitalista, mas acho que está na hora das empresas refletirem sobre a saúde mental das pessoas pretas, realmente o mercado precisa preparar essas lideranças antes de colocar uma pessoa preta abaixo desses líderes sem preparo e empatia.
Temos nossa estima baixa por que o mundo diz o tempo todo que não somos capazes e acabamos esgotadas (com burnout). Eu já passei por isso, por não suportar, por ter medo e por achar que aquele trabalho era a única coisa da minha vida e que eles estavam sendo fofos se preocupando com o meu bem estar e lazer. Mas na real, era pra eu poder ficar e produzir mais, sem direto a ficar esgotada.
Eu me perdi muitas vezes, me encontrei e me aquilombei no ombro de muitas pretas que não me deixaram desistir e que me fizeram acreditar nas inúmeras possibilidades do mundo, embora saibamos que precisamos resistir enquanto o mundo fora está um caos, onde o racismo estrutural está longe de acabar, mas precisamos juntos nos unir e nos proteger.
Eu sei que para alguns a terapia é algo que nem todos tem oportunidade, pois, nosso país não prioriza a saúde mental, mas falem e chorem e não deixem que o mundo corporativo dite sua capacidade.
Lembre-se que você é o sonho dos nossos ancestrais, e eles tem orgulho de você estar aqui, lutando e resistindo por eles.